Entrevista com um dos compositores da Portela.
Quantas
vezes você já passou por algo assim? Aqueles segundos
intermináveis que vão decidir a sua vida? Quem persiste passa por
isso.
Mas
por quanto tempo vale a pena insistir naquilo que parece impossível?
Dois anos? Três anos?
“Quando
eu entrei para ala de compositores da Portela eu até brinquei: vou
me dar 10 chances. Vou me dar 10 chances. Eu to na 8ª”, conta
Celso.
Há
oito anos Celso compõe sambas para a Portela. Nenhum deles você viu
na avenida.
“Imagina sendo seu samba? “Então você imagina este trabalho seu na avenida. De tudo o que você percorreu para chegar aquele produto ali. Caraca! Pô, conseguimos. Dá vontade até de chorar”, diz.
“Imagina sendo seu samba? “Então você imagina este trabalho seu na avenida. De tudo o que você percorreu para chegar aquele produto ali. Caraca! Pô, conseguimos. Dá vontade até de chorar”, diz.
A
Portela este ano escolheu a região do porto do Rio de Janeiro como
tema do Carnaval.
“A
sinopse vem dizendo ali. A maré vai subir e tal. Sei que o nosso
refrão já começa com isso”, explica.
Mas
imagina que difícil ganhar se não longe dali existe um adversário
como Noca da Portela:
Você já deve ter ouvido falar de Noca da Portela.
Você já deve ter ouvido falar de Noca da Portela.
“A
primeira vez que eu ganhei um samba em 76. Minhas pernas tremiam
tanto que eu digo: vou morrer. Vou morrer. Porque amor de primeira
deixa sua perna bamba”, lembra Noca.
É
a 13º disputa do Noca. Já emplacou o samba vencedor seis vezes. Ele
não entra para perder.
“Eu
tenho um sonho. Por isso eu to com 80 anos e ainda estou disputando.
E esse sonho pra mim ainda não acabou”, garante Noca.
E
Celso ainda vai ter que enfrentar o seu maior algoz. Nos últimos
dois anos ele perdeu a disputa para o Toninho.
O
professor de filosofia emplacou o samba da Portela dos carnavais de
2012 e 2013. É o atual campeão. Aclamado pela crítica.
“Nós
ganhamos o estandarte no primeiro e o segundo foi o único samba com
10 de todos os 4 jurados”.
Ele
tem tudo para ganhar. Agora entendeu por que eu pergunto ‘quanto
tempo vale investir num sonho’?
E
quando eu digo investir eu estou falando de dinheiro, mesmo!
Reporter:
Este ano quanto você acha que vai gastar?
Celso: Talvez chegue aos R$ 40 mil.
Celso: Talvez chegue aos R$ 40 mil.
São
R$ 40 mil que esse bombeiro militar planeja gastar na disputa.
Reporter:
E sua mulher não reclama?
“Eu
de vez em quando reclamo, né? Aí eu tenho que maneirar um pouco
porque ela gasta muito no samba. Mas aí eu acabo aceitando porque eu
sei que é uma coisa que ele gosta de fazer. E tudo. Eu dou apoio pra
ele”, diz a esposa Claudia Lopes.
A gastança começa logo depois que o samba fica pronto. Porque todo compositor que se preze grava seu samba num estúdio. Não tem mais essa de gravação caseira.
“Só
o estúdio saiu pra R$ 4 mil”, conta Celso.
E
depois disso, tem que fazer os CDs pra distribuir. Eles vão ser
muito úteis quando começar a disputa na quadra.
Adilson calhou de morar bem do lado da quadra da Portela. Ele instalou um equipamento de som e fica revezando os samba-enredos candidatos.
“Esse
é o point dos compositores da Portela. Toda semana é isso ai”,
conta o DJ e vigilante Adilson de Ferreira.
E
todo compositor quer que seu samba toque no Adilson para o pessoal ir
se familiarizando. Na hora marcada para começar a disputa, os ônibus
já começam a parar na porta. Eles são fretados pelos compositores
para trazer a torcida.
Tudo
para impressionar os jurados. Eles sentaram na bancada pela
primeira vez na sexta, dia 9 de agosto, para julgar 35 sambas. Na
Portela, os jurados são os próprios diretores da escola. Cada um
tem um voto. Eles têm visão privilegiada do palco. E é lá,
no palco, que fica o maior gasto de cada um dos concorrentes.
E
são os compositores os responsáveis por fazer o show funcionar. Ou
seja: eles têm que contratar todos os músicos. Por semana, para
pagar o que chamam de preço de palco, o Celso gasta cerca de R$ 3
mil.
Mas
no dia em que não tem disputa, a campanha continua em casa. Tem que
pagar o churrasco.
“Dinheiro
é difícil de arrumar, mas dá se um jeito. Serve pra ônibus, para
cerveja, para ingresso, para o churrasco. Um montão de coisas que
envolve o samba enredo”, explica Noca
Reporter:
E se perder?
Noca : Se perder ele fica no prejuízo. É um jogo. Você vai apostar. É um jogo de perde ou ganha. Se você perder, você perde o dinheiro. Se você ganhar, você tem o retorno e a gloria.
Noca : Se perder ele fica no prejuízo. É um jogo. Você vai apostar. É um jogo de perde ou ganha. Se você perder, você perde o dinheiro. Se você ganhar, você tem o retorno e a gloria.
Este
ano o compositor do samba-enredo vencedor da Portela vai levar pra
casa cerca de R$ 400 mil.
“Isso
é uma fortuna. Você se sente milionário até, brinca Noca
“Se
eu ganhar, eu pretendo ir para Belém descansar. Lá para o Mosqueiro
que é a terra da minha mãe”, adianta Toninho.
“A
casa, que era uma só, virou duas. “Meu irmão reformou metade.
Minha irmã reformou outra metade. Eu pretendo construir a minha.
Pretendo construir no mesmo lugar uma outra casa”, planeja Celso.
Todo
mundo sonha com o dinheiro. Mas há sempre muito por trás de
qualquer disputa milionária.
Por isso surgiu um esquema que no mundo do samba é conhecido como ‘escritório’. Um mesmo grupo de compositores faz sambas para várias escolas diferentes. Mas inscrevem esses sambas nas disputas com o nome de outros autores, que são populares entre as comunidades.
Por isso surgiu um esquema que no mundo do samba é conhecido como ‘escritório’. Um mesmo grupo de compositores faz sambas para várias escolas diferentes. Mas inscrevem esses sambas nas disputas com o nome de outros autores, que são populares entre as comunidades.
“Por
exemplo, compositor x faz para escola dele. E ai ele aproveita esta
estrutura e faz pra outras escolas e concorre em 5. Se ela ganhar em
3 e perder em 2 ele já está no lucro”, explica Toninho.
Isso
ajuda porque o dinheiro usado na campanha é diluído entre várias
candidaturas.
“Os
sambas de enredo hoje se parecem porque os autores são os mesmos”,
afirma Toninho.
Reporter:
Existe samba de escritório na Portela?
“Acho
que não. Eu conheço quem são as pessoas que fazem samba de
escritório. Eu sei quem são essas pessoas que utilizam do nome mas
foi outra pessoa que fez”, diz o presidente da Portela Sérgio
Procópio.
Reporter:
A gente pode dizer que em muitas escolas este tipo de samba acontece?
Toninho:
Praticamente em todas. Em todas as escolas do grupo especial e nas de
acesso também.
Quem não quer fazer parte disso, busca investidores. Davi Correa compôs sozinho um samba-enredo para a Portela. Mas colocou o nome de Luis Matos como parceiro.
“Eu sou mais o investidor. E a parte toda de organização de torcida”, explica o investidor Luis Mattos.
“Nessas parcerias nem todos compõem. Neste caso, eu e Toninho somos compositores. E tem a parceria que é o pessoal que entra com dinheiro, que entra com torcida”, explica o jornalista Luis Carlos.
Davi chegou à semifinal. Os diretores decidiram, a portas fechadas, que ele não iria pra frente.
“Parei, parei com samba. Não dá mais. É muita covardia”, lamenta Davi Correa.
Também
na salinha, decidiram quem seriam os grandes finalistas: samba de
Celso, de Noca da Portela e de Toninho Nascimento.
A
noite da final da disputa do samba-enredo da Portela começou com
todos os compositores da ala dos compositores reunidos. Menos um que
não conseguiu estar presente. O Toninho. Foi pra casa. Superstição.
E
o samba do Toninho, representado pelo parceiro Luis Máximo, foi o
primeiro a subir no palco.
Noca
estava no camarim esperando porque ele vai ser o segundo a se
apresentar. Celso, ficou tenso a noite inteira. Ele vem carregando o
samba nas costas há seis meses. E tudo vai se resolver nessa
apresentação.
“Mas
só a satisfação de estar ali concorrendo a um samba pra Portela,
paga. Tanto é que eu estou perdendo todo ano aí e estou lá de
novo. Lá de novo. Lá de novo. Estou persistindo”, afirma Celso.
No
fim da noite os 33 jurados se encaminham para uma sala onde acontece
a contagem dos votos.
A
decisão é uma das mais importantes da escola, por isso a tensão
aumenta dentro e fora da sala. Foi muito trabalho duro.
E
os jurados escolheram o grande vencedor: “O nosso novo hino é dos
compositores
Toninho Nascimento, Luis Carlos Máximo, Waguinho, Edson. Jota Amaral”.
Toninho Nascimento, Luis Carlos Máximo, Waguinho, Edson. Jota Amaral”.
Reporter: Quanto tempo vale a pena insistir?
“Eu
me considero um vencedor. Eu sou o pai da obra. Para mim, era o
meu.Não vou desistir”, garante Celso.
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