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sábado, 20 de fevereiro de 2016

Festival de Berlim premia o retrato da Ilha de Lampedusa, destino de milhares de refugiados


Gianfranco Rosi com o Urso de Ouro de ‘Fuocoammare’, ao lado da presidenta do júri, Meryl Streep.

Foi a conclusão lógica de dez dias de cinema politizado e comprometido com os diversos males que sacodem o planeta. O Festival de Berlim premiou na noite de sábado o documentário Fuocoammare (que pode ser traduzido como fogo no mar), sexto filme do cineasta italiano Gianfranco Rosi, que passou mais de um ano em Lampedusa para descrever o afluxo maciço de refugiados à ilha, o dispositivo implantado pelas autoridades para acolhê-los e também as vidas dos habitantes do lugar.
“Dedico este prêmio ao povo de Lampedusa, sempre acolhedor e com o coração aberto a outros povos”, disse Rosi ao receber o prêmio, acompanhado por um de seus protagonistas, o doutor Pietro Bartolo, que faz parte do pessoal de saúde que examina os refugiados. “Quando lhe perguntei por que Lampedusa é um lugar tão generoso, ele respondeu que é uma ilha de pescadores e que os pescadores sempre aceitam tudo o que chega pelo mar. Essa é uma grande lição para aprender”, acrescentou o diretor, que espera que seu filme contribua para abrir “as barreiras mentais” que observa no continente. “Não é aceitável que haja pessoas que morram cruzando o mar”, disse ele. Rosi já havia vencido o Festival de Veneza em 2013 com seu filme anterior, o documentário Sacro GRA.
O prêmio foi anunciado pela presidenta do júri, Meryl Streep, que disse ter visto no filme “uma posição política, mas também arte e nuances”, além de demonstrar “o que um documentário é capaz de fazer: exigir um lugar diante de nossos olhos”. O documentário, que empresta o título de uma canção de marinheiros, também era o favorito da crítica, apesar de algumas reservas sobre a abordagem escolhida por Rosi. O diretor enfrenta duas realidades que roçam sem se tocar, além de dar uma importância excessiva a um pitoresco filho de pescador, personagem sedutor e quase neorrealista. Os imigrantes, no entanto, nunca falam.
O júri soube recompensar os únicos filmes que se destacaram em uma seção oficial fraca e em alguns momentos indigna de um grande festival. O Grande Prêmio do Júri foi para Smrt u Sarajevu (Morte em Sarajevo), do bósnio Danis Tanovic, que reflete sobre a explosiva história dos Bálcãs a partir de uma peça de Bernard-Henri Lévy. O filme, um pouco empoeirado, mas hábil em seu cruzamento de pequenas histórias e com uma carga metafórica acertada, é ambientado durante o 100º aniversário do assassinato de Francisco Ferdinando da Áustria dentro de um hotel luxuoso e decadente na capital da Bósnia, que parece afundar à mesma velocidade que o país que o abriga.
A melhor diretora foi a francesa Mia Hansen-Løve por L'Avenir (O Futuro), drama discreto sobre uma professora de filosofia abandonada pelo marido, interpretada por uma excepcional Isabelle Huppert, confrontada à necessidade de se reinventar e ao presente envenenado da “difícil liberdade”, sobre a qual discorreu Levinas. A jovem diretora, figura essencial do novo cinema francês, dedicou o prêmio à atriz: “Obrigado por sua confiança e por transferir sua inteligência e humor ao filme”.
O prêmio de melhor ator foi para Majid Mastura, protagonista do tunisiano Hédi, retrato sensível de um jovem insatisfeito que sonha escapar de seu país, em conflito com o peso da família e de sua cultura, um filme que também recebeu o prêmio de melhor primeiro filme. A dinamarquesa Trine Dyrnholm foi eleita melhor atriz por The Commune (A Comunidade), de Thomas Vinterberg, um longa-metragem desigual e enganador, no qual se salva sua pungente interpretação de uma jornalista que perde o marido em pleno auge do amor livre nos anos setenta, suplantada por uma espécie de duplo mais jovem.
A premiação também recompensou a radicalidade do cineasta filipino Lav Diaz, que recebeu o Prêmio Alfred Bauer, destinado a um trabalho que abra “novas perspectivas” para o cinema, por seu filme A Lullaby to the Sorrowful Mystery(Uma Canção de Ninar para o Mistério Triste), de oito horas de duração. Composto por um número quase infinito de vinhetas filmadas em plano fixo, o filme descreve a revolução filipina de 1896 contra o Governo colonial espanhol, explanando fatos históricos que não se aprendem nas escolas. Diaz dedicou o prêmio a “aqueles que acreditam que o cinema pode mudar o mundo”.

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