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terça-feira, 14 de outubro de 2014

Tupy de Braz de Pina - Um pouco de sua história.



Um pouco da história de uma querida escola da samba do subúrbio do Rio de Janeiro, que hoje não existe mais, deixando muita saudade.


Uma reportagem de "O Batuque"


A Tupy de Braz de Pina é uma das mais tradicionais escolas de samba da história de nosso carnaval. E "é" justamente por isso, por fazer parte da História, mesmo que seus dias de desfile tenham terminado. Terminaram, mas não foram esquecidos. A extinta escola do subúrbio carioca continua viva, não apenas nas páginas da História, como na memória de gente bamba.




Originado de um time de futebol e de um bloco carnavalesco, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Tupy de Braz de Pina foi fundado na rua Guaíba em 20 de janeiro de 1951, no bairro que lhe deu o nome. Em seus primeiros anos, desfilou apenas pelas ruas do subúrbio, até 1956, quando fez sua primeira apresentação na Praça Onze, desfilando sem concorrer. De 1957 a 1998 passeou pelos diversos grupos do carnaval carioca. Depois, fechou o barracão e virou história.

Entre outros carnavais, a Tupy (assim, com "y", conforme ostentava seu pavilhão) cantou Caymmi antes da Mangueira, fez Manôa antes da Beija-Flor, visitou a Bahia, exaltou o saudoso Sargentelli e a eterna rainha Marlene, a arte de Almeida Jr., Gonçalves Dias e Chiquinha Gonzaga, cruzou o sertão com o São Francisco e tirou o Brasil para dançar.Para relembrar um pouco desse passado, a reportagem de OBatuque.com aproveitou uma gostosa tarde do verão carioca para visitar a Rua Guaíba e bater papo com antigos integrantes da agremiação, sendo recebida por personagens de duas gerações da Tupy. O ex-presidente Jacyr Figueira e o compositor Deco relembraram saudosos momentos e explicaram por que a Tupy não mais pisou a passarela de desfiles.

Seu Jacyr Tupy, como gosta de ser chamado, 84 anos, mineiro de Além Paraíba, ex-ferroviário, lembra do ano de 1955, quando entrou na escola como Harmonia e aos poucos foi assumindo outros papéis como tesoureiro, membro do Conselho Deliberativo, vice-presidente na gestão de Gilson Cerqueira e, depois, presidente quando do afastamento de Gilson.



OBatuque.com – Como foi que o senhor assumiu a escola?



Jacyr Tupy - Quando era vice, ocorreu um problema com a verba da subvenção dada à escola, o Gilson se afastou e o Conselho me indicou pra assumir a presidência. Foi um carnaval difícil, a gente teve que fazer festas, almoços, reuniões na quadra para arrecadar dinheiro e foi com esse dinheiro que a gente conseguiu pagar carnavalesco e vestir bateria, comissão de frente, MS & PB e baianas. O carnavalesco foi o Felix, era um desfile pelo Grupo 1 e, se não me engano, o enredo era “Riquezas áureas da nossa bandeira” (1976). Quem cantou o samba, um belo samba por sinal, foi o Celso Landrini e a bateria era por conta do Pingüim e do Carlinhos. Só que a gente desfilou depois da Em Cima da Hora com “Os Sertões” e o povão todo estava assombrado com o samba deles. Nosso desfile atrasou por causa do cavaco, o Celso teve que parar e teve vaia e nós não fomos bem, não.

OBatuque.com – Como foi que a escola ascendeu ao 1º grupo?
Jacyr Tupy – Foi em 72. A gente falou de Chiquinha Gonzaga e tiramos nota 10 de ponta a ponta. Olha que o samba era tão ruim que ninguém nunca mais cantou na quadra. Naquele ano desfilamos com instrumentos emprestados pela Beija-Flor, chapéus da Santa Cruz e o presidente era o Sidney. No dia do resultado, passei pelo jornaleiro, ele estava com o radinho e perguntei quem tinha vencido o carnaval. Ele falou que a Mangueira estava na frente e eu disse que queria saber era do 2º grupo. Ai ele mandou: Tupy de Braz de Pina. Tomei o maior susto. Quando desfilamos no 1º grupo em 73, ficamos na frente da Vila, mas quem acabou descendo foi a Tupy. Mais à frente subimos de novo, com o enredo da Marlene (veja fotos do desfile na caixa ao final da matéria), desfilando na Candelária.

OBatuque.com – Seu Jaci, fala um pouquinho pra gente como foi a visita do Governador Negrão de Lima à quadra da Tupy na década de 60?
Jacyr Tupy – O presidente da escola na época resolveu fazer uma festa pra homenagear o governador. Ele veio, era um dia de muita chuva. Ele entrou na quadra carregado no colo, já que era numa rua de barro, botaram ele direto no palanque e o pessoal sambou dentro d'água e pintou o sete a noite toda. Foi quando passou de bloco pra escola de samba, então aquela festa foi boa a beça. A Tupy fazia muita festa. Vinha o pessoal da Mangueira, da Portela, do Salgueiro... A Tupy sempre teve amizade com todas as escolas.

O Batuque.com - Quais os desfiles que o senhor Lembra com mais carinho?
Jacyr Tupy – Gostei muito de “Brasil, glória e integração”, (1975) com o samba do Leonel Vieira, o Caciça. Eu era diretor de Harmonia. Desfilamos na Presidente Vargas, sentido Candelária, e quem fez o carnaval foi o Sr. Augusto, com sua filha Solange, eles ajudaram muito a escola. Outro que gostei foi “Inconfidência Mineira”(1958).

O Batuque.com – Como eram feitas e transportadas as alegorias nesses desfiles?
Jacyr Tupy – Não eram grandes como as de hoje, mas davam um trabalho. A gente levava na mão, na munheca mesmo. Teve uma vez, que era um índio com nossa bandeira, que tinha 5 metros de altura. Juntava uns vinte caras, saía de noite e chegava lá pela manhã, já tudo prontinho pra desfilar. Tirava um fio, empurrava galho de árvore e dava tudo certo no final. O problema maior era quando tinha viaduto e tinha que virar o carro, dar um jeito para passar.

O Batuque.com – Como eram os ensaios da Tupy?


Jacyr Tupy – Era muito bom, rapaz. Juntava o pessoal ali mesmo no viaduto, o povo escutava o barulho e começava a aparecer gente de todo canto. Tinha muita mulher, muita gente conhecida, todo muita batia por lá, gente da Penha, de Brás de Pina... Sempre tinha uma comida boa, uma cerveja gelada e o pessoal ficava. Depois das confusões que o pessoal foi arrumando, a turma do olho grande, os componentes foram indo pra outras escolas. Teve uma turma que foi pra Grande Rio, outros da bateria foram pra Imperatriz e assim foi ficando cada vez mais vazio.

O Batuque.com – Seu Jaci, fala para gente da saudade que o Sr. tem dos tempos da Tupy.
Jacyr Tupy – Olha, eu casei, vim morar aqui depois de ser cantor de orquestra por quase vinte anos. Então, quando conheci a escola, participava muito de festas e shows na quadra. Era muito bom, conheci muita gente, muita mulher, fiz muitos amigos e aqui tive uma vida de boemia. Minha mulher nunca me impediu de aproveitar o samba, até porque quando me conheceu eu era cronner de orquestra. Aqui em casa era o ponto de encontro da Velha Guarda da escola. Antes do desfile, o pessoal vinha pra cá se arrumar e bater papo. Teve o Estandarte de Ouro que a Tupy ganhou com o “Essa Nega Fulo” de 74. Teve uma vez que a Tupy se apresentou na Rádio Globo e eu cantei o samba “A seca do nordeste” de 1961, depois no Copacabana Palace, na Vila Militar... Foi uma época muito boa. A Tupy era sempre chamada pra fazer essas festas e eu estava sempre lá, era o cronner fazendo o fundo musical. Eu procurava fazer tudo sempre certinho e ninguém tinha nada contra mim, e com isso fazia muitos amigos. Hoje a Tupy é uma lembrança muito boa para mim. Tempo de alegria, bons enredos e bons carnavais.

Duas gerações após a de seu Jacyr Tupy, o ex-ritmista, ex-passista e compositor Deco, 50 anos, que chegou na Tupy entre os anos de 71 e 72, também falou sobre os bons tempos da escola de Brás de Pina.

OBatuque.com – Deco, conta um pouco do seu tempo de Tupy de Braz de Pina e das lembranças que você tem.
Deco – A saudade é imensa, cara. A Tupy era nossa segunda casa e foi uma infância maravilhosa ali com aqueles baluartes da antiga. Conheci muito sobre carnaval com essas pessoas. Hoje em dia, a gente se encontra principalmente nos ensaios do Bloco Tupiniquim da Penha Circular sob o viaduto e fica relembrando e matando a saudade dos belos tempos da Tupy de Braz de Pina.

OBatuque.com – Fala de um carnaval que o tenha marcado mais.
Deco – Olha, todos os carnavais da Tupy foram emocionantes. Mas o primeiro que assisti, que foi uma primeira experiência dentro de uma escola de samba, já que eu era de uma comunidade que só tinha bloco, foi um carnaval maravilhoso, com lindas alegorias, com um enredo maravilhoso, que se não me falha a memória foi “São Francisco a caminho do Sertão”, em 1971. Eu não cheguei a desfilar, estava chegando novo na comunidade e alguns colegas já desfilaram esse ano e eu assisti ao desfile na Avenida Rio Branco. Foi um desfile que me emocionou muito.

OBatuque.com – Você consegue explicar de forma resumida por que a escola foi acabando?
Deco – Olha, isso é um pouco difícil, porque é uma coisa mais dos bastidores, do comando maior da escola. Coisa de diretoria e presidentes. Acho que foram muitos erros seguidos que aconteceram com a Tupy de Braz de Pina, no sentido de administração da subvenção e investimento para a escola. Acho que houve muito pouco investimento na escola e na sua comunidade. Acho que foi um dos grandes erros dos diretores da Tupy.

Hoje, a antiga quadra da Tupy de Braz de Pina recebe os ensaios do Bloco Carnavalesco Tupiniquim da Penha. Um berço de samba a serviço da cultura popular que ainda resiste como ponto de encontro de gente bamba.

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