O universo pop gira com tal velocidade que estrelas mudam de lugar quando passam na peneira do tempo. Banda carioca alocada no terceiro escalão da hierarquia bem rígida do pop rock brasileiro da década de 1980, Biquini Cavadão sobreviveu bem na gigante roda-viva do mercado fonográfico ao longo dos 34 anos de vida. Ao lançar o 16º álbum da discografia oficial, sintomaticamente intitulado As voltas que o mundo dá, o grupo mostra mais vigor do que bandas já extintas ou cambaleantes do primeiro escalão do rock nativo dos anos 1980.

Mesmo que eventuais músicas menos inspiradas, casos de Um minuto com você (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Eric Silver) e de Pra sempre, seu maior amor (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Simon Spire), patinem na reiteração excessiva do tema básico do álbum (a cumplicidade afetiva), a safra de 12 inéditas de As voltas que o mundo dá consegue obter maior unidade do que a do repertório do anterior (bom) disco de estúdio do grupo, Roda-gigante (2013).

A diferença talvez esteja toda na produção de Liminha, piloto seguro deste disco programado para ter chegado às plataformas digitais na última sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017, mas efetivamente disponibilizado a partir de hoje, 7 de fevereiro, pela Coqueiro Verde Records. Produtor referencial do rock brasileiro dos anos 1980, Liminha nunca tinha formatado um álbum do Biquini Cavadão. Em As voltas que o mundo dá, Liminha toca o virtuoso baixo e eventualmente responde por violão, bandolim e loops. Já primeira faixa, Soltos pelo ar (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Dudy Cardoso), excelente rock de refrão poderoso, dá para sentir a pressão posta por Liminha na produção do disco. O som do Biquini Cavadão está com pegada inédita nos discos de estúdio da banda (nos registros ao vivo de shows, a pegada já era evidente). Foi como se, no estúdio, o grupo tivesse tomado injeção de ânimo com o produtor.

Até o canto de Bruno Gouveia soa mais vigoroso, como evidenciam as gravações de músicas como Você marcou (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Dudy Cardoso) e Um rio sempre beija o mar (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Dudy Cardoso), faixa escolhida equivocadamente como primeiro single do álbum – talvez por conta da arquitetura ligeiramente mais pop, embora, pop por pop, Nossa diferença de idade (Say you love me) Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Rodrigo Coura) pareça ter mais cacife para encarar o populista mercado comum da música humana.

Cabe ressaltar que o disco cresce quando o Biquini Cavadão toca rocks como A saudade é o museu do amor (Good enough) (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Beth Cart) e, sobretudo, Coragem (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Dudy Cardoso), tema de urgência punk. Outro trunfo do repertório, Descobrimentos (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho e Miguel Flores da Cunha) tem atmosfera neo folk. Já Arco-íris (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha e Dudy Cardoso) é power balada cujo toque da guitarra ecoa sons da Legião Urbana sem alcançar o colorido psicodélico pretendido pela banda na faixa.

Canção aditivada com suaves efeitos eletrônicos, Como eu te conheci (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho, Miguel Flores da Cunha, Izabella Brant e Theo Lustosa) versa sobre encontro de amor com inspiração em afetos reais dos músicos, assim como Beijar sem fim (Álvaro Birita, Bruno Gouveia, Carlos Coelho e Miguel Flores da Cunha), cuja letra parece focar universo adolescente.

Enfim, mesmo que as letras nem sempre tenham a pegada das músicas, o disco As voltas que o mundo dá revigora o som do Biquini Cavadão pela benéfica conexão com Liminha, exemplo de casamento feliz entre banda e produtor. Não é todo dia que uma banda de idade balzaquiana lança álbum com músicas inéditas com frescor juvenil em vez de esperar o fim tedioso